Eu vim dos ervais, meus irmãos, do fogo dos barbaquás, do canto triste e gemente dos urus, dos bailados divertidos, dos entreveros dos bolichos das estradas, do mais hirsuto da paulama seca, do pôr-do-sol campeiro, dos dutos, das encruzilhadas e das distâncias perdidas. Eu sou filho da jungle, sou gaudério de todos os pagos, apaixonado das querências e cria de todos os galpões da terra.
Eu vim de longe, eu sou um misto de poeira de estrada, de fogo de queimada, de aboio de vaqueiro, de passarada em sarabanda festiva no romper da madrugada, de lua andeja rendilhando os campos, as matas, as canhadas, o vargedo. Sou misto, também, de índio vago, cruza-campo e trota-mundo.
Os ventos do destino – maus e bons – levaram-me a pagos diferentes. Os meus pés dilacerados trilharam muitos caminhos. (...)
Eu vim, em verdade, dos charcos e da poeira revolvente dos tempos, mas com o confor to grandiloqüente de ter sido guiado por essa luz mirífica que é o farol divino que indica, neste tormentoso vale de lágrimas, aos bons e aos puros de espírito, o caminho certo da vida.
Procurei cantar com ternura e suavidade as belezas incomparáveis do sertão e, tanto quanto possível, procurei descrever com fidelidade as paisagens coloridas das estâncias.
Fui gemido de carreta manchega no estirão da serra íngreme e fui, também, envaidecido, tropel de tropilha crioula e índio aragano, trilhador de todos os caminhos.
Amei, imensamente, o vazio aberto. Nele, sempre vi, orgulhoso e confortado, a obra incomensurável do Senhor.”
Esse texto *intenso, me foi enviado com muito carinho pela Ana Paula (minha querida professora) e é parte do discurso de posse do escritor sul-matogrosse Hélio Serejo, na academia matogrossense de letras em 1973.
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